sexta-feira, 16 de maio de 2008

RESENHA SOBRE A PARTE A DA TESE DE DOUTORAMENTO DE IVETE PIERUCCINI_por Luciana Rodrigues

RESENHA SOBRE A PARTE A DA TESE DE DOUTORAMENTE DE IVETE PIERUCCINI INTITULADA A ORDEM INFORMACIONAL DIALÓGICA : ESTUDO SOBRE A BUSCA DE INFORMAÇÃO EM EDUCAÇÃO_POR LUCIANA RODRIGUES

No ano de 2004 a professora Ivete Pieruccini doutorou-se na Escola de Comunicação e Artes da Universidade de São Paulo orientada pelo Professor Doutor Edmir Perrotti, com tese intitulada A ORDEM INFORMACIONAL DIALÓGICA : ESTUDO SOBRE A BUSCA DE INFORMAÇÃO EM EDUCAÇÃO.

A pesquisa foi motivada, como explica a autora, pela sua experiência como bibliotecária em bibliotecas infanto- juvenis municipais, observando posturas de “perplexidade, enfado ou medo” dos escolares, buscando informações dentro do labirinto de prateleiras, quase intransponível que a eles se apresentava ao tentarem realizar suas pesquisas, nas palavras da autora eles se mostravam ”perdidos, desamparados, sem saber por onde começar, o que e como procurar”. Ou seja, faltavam condições mútuas: tanto dos escolares, ao não dominarem as ferramentas necessárias para chegarem aos seus objetivos quanto das próprias bibliotecas, que não criavam condições para tal. E pode-se estender esse diagnóstico para quaisquer outras situações que demandem educação e informação, não só para bibliotecas.

Com isso a busca pela informação, em seus aspectos físicos e simbólicos, prejudica-se sobremaneira, comprometendo toda apropriação e construção de conhecimentos e cultura, e sua produção por parte desses jovens. Pierruccini nota que essa situação de exclusão da produção e circulação de conhecimento, só pode ser revertida por ações efetivas, sistemáticas que, das poucas vezes que se dão no nosso País, sempre são precárias.

A tese da autora foca-se, então, na educação para informação,. Não basta que as informações existam e até estejam disponíveis, é necessário que seja ensinado como buscá-las e como delas apropriar-se para construção dos conhecimentos, é essencial o desenvolvimento de “competências e atitudes” para que isso se dê.

Essa precariedade na apropriação de informações aumenta com a atualidade, motivada pelo excesso de informações que todos recebemos a todo instante e que não podemos dar conta de apreender criticamente todos esses signos. Quando se trata de bibliotecas infantis, nota a autora, esse excesso de informações demanda uma nova postura: além da oferta de acesso às crianças e jovens há que se criar condições “para a transformação de seus produtos em bens simbólicos, de seus materiais informacionais (livros jornais, revistas, cds, slides, dvds, cd- roms, sites) em processo de construção de significados” (pagina 12).

Pierruccini faz uma interessante diferenciação entre Pesquisa Informacional e Pesquisa Documentária. Ambas aplicam-se a documentos, sendo que a Documentária lida com documentos estruturados, de edição e distribuição controladas por especialistas, enquanto a Informacional trata de documentos em mutação, de formas múltiplas, que subvertem a tradicional ordem emissor-difusor-receptor, como se observa na internet.

O aspecto da busca nesses dois universos complexos de pesquisa requer muito mais do que habilidade, mas competências, como a autora ressalta ao utilizar-se dos termos propostos por Perrenoud Essa competência deve contemplar: 1- Problematização por parte do pesquisador- com identificação do tema e formulação de uma pergunta; 2- Busca das fontes e elaboração da informação; 3- seleção e elaboração da informação; 4- produção/criação de novas informações.

Ainda sobre Perrenoud:

A educação por competência, de que trata Perrenoud, tem correlação com a educação para informação (information literacy ou éducacion a l´information) que surgiu a partir do final da década de 1980, sobretudo na Inglaterra, França, Estados Unidos e Canadá (...) A American Library Association (ALA), por meio do Comitê Presidencial de Educação para a Informação, apresentou Relatório Final, em 1989, no qual estabeleceram-se alguns conceitos relacionados à problemática da informação na atualidade, com vistas a orientar novos paradigmas em educação. O relatório indicava que todo o ser humano pensante precisa ser ensinado a lidar com informação...” (PERRUCCINI, 2004: 23
)

Ainda sobre o referido relatório da ALA, ressalta-se que a capacidade de lidar com a informação deve incluir não só a palavra impressa, mas a competência para outras informações, visuais, computacionais e midiáticas. Essas competências dizem respeito a saber usar o acesso, a reconhecer a importância e a pertinência de cada informação; a avaliar cada informação de forma crítica, diferenciar fatos de opiniões e saber usar cada uma delas em contextos diversos e a usar, através de seleção e organização, a nova informação para resolver problemas e dar publicidade aos conhecimentos formulados de forma adequada.

Essa tese, objeto da resenha, faz um interessante panorama sobre diversas experiências com educação para informação ao redor do mundo.

Existe o programa, no Estados Unidos, dirigido especialmente a alunos do segundo grau denominado The Big Six Skills (The Big 6,) que “inclui um programa, a definição de um processo aplicado à resolução de problemas de informação e um conjunto de habilidades a serem desenvolvidas pelos alunos para efetivação da busca e atendimento às necessidades informacionais” (PERRUCCINI, 2004: 25). Six, pois são seis as operações que propõe para o desenvolvimento das competências para a informação, que abarcam todas as etapas de pesquisa.

Ainda no EUA há o programa de Caroline Kulthau, cujas atividades se iniciam com a preparação para ação, incorporando categorias afetivas do processo de aprendizagem, como a incerteza e apreensão no contato com o novo (informação), que causam mudanças no sujeito.

Em Montreal existe um trabalho que a então candidata ao doutoramento considera particularmente completo para orientação aos alunos no uso das informações, com etapas claras, estando disponível na internet com diversos links úteis, desenvolvido pela EBSI (École de Bibliotheconimie et Sciences de Information), voltado para pesquisa informacional na rede e nas bibliotecas.

Vêm da França outras experiências, esclarece a professora:
A idéia da educação (ou formação) para informação se desenvolve paralelamente ao crescimento das concepções de práticas de trabalho autônomo, do controle permanente de conhecimentos e dos savoir- faire. O objetivo, no quadro francês, sobretudo, é o desenvolvimento de práticas de formação eficazes, acompanhadas de mecanismos de avaliação (PERRUCCINI: 2004, 27).


Nesse contexto é destacado o trabalho da FADBEN- Féderatión des enseignants documentalistes de l´Education nationale e seu processo. Também na tela dos programas para aprendizagens informacionais em bibliotecas escolares foi publicado em 1996 no Savoir lire avec lês bibliothéques centres documentaires um estudo onde M. Butlen, M. Couet e L. Dessally reúnem diversos trabalhos sobre as competências desejáveis e as indesejáveis para os jovens do século seguinte (no caso o XXI) e as funções das bibliotecas escolares. Discutem leitura, biblioteca e competências informacionais, aproximando-se das produções canadenses.

Já no Brasil, ressalta PERRUCCINI, o quadro sobre educação para informação é outro. Em 2004 havia só um estudo localizado na rede da USP, como dissertação de mestrado. Essa dissertação fala sobre problemas próprios da temática, como a avalanche de informações e o papel das bibliotecas e bibliotecários, sistematizando literaturas sobre o tema. Todavia o que a literatura brasileira apresenta dentro da expressão busca está bastante aquém do que ela efetivamente significa, reduzindo-se a identificação, localização, processamento e comunicação de informações.

Perruccini cita Hannah Arendt “o fio da tradição está rompido, e temos de descobrir o passado por nós mesmos- isto é, ler seus autores como se ninguém os houvesse jamais lido antes”. Esse trecho serve à autora da tese para salientar como a busca e a pesquisa são artigos de primeira necessidade para recompormos a relação com a memória social, rompidos pela contemporaneidade. Esse processo, de recriar sentidos e significações, é algo a ser ensinado e praticado, principalmente pela educação, mas também fora dos ambientes escolares. A educação para informação trata-se, a como diz a autora na página 33 de enfatizar,, “sobremaneira a importância do domínio e desenvolvimento de operações para o uso da informação e de seus dispositivos, tendo em vista a otimização do uso de recursos informacionais disponíveis”.

O grupo coordenado pelo Prof. Perrotti, orientador da tese em tela, cunhou o termo Infoeducação e se distinguiu de alguns trabalhos que secundarizavam o papel dos dispositivos. O campo da Infoeducação tem natureza tanto teórica quanto prática “voltado para o estudo das relações cada vez mais complexas entre informação e educação” (pág 35). Essa complexidade diz respeito a já mencionada avalanche e, também,a aceleração, marca do nosso tempo. Os modos de apropriação do conhecimento e da significação estão completamente alterados, como se deu na época da invenção da escrita, onde Platão já notava que os processos de relação comunicacional nunca mais seriam os mesmos, perdendo-se características importantes de troca entre indivíduos. Essas transformações também foram verificadas com a invenção da prensa. Hoje, inciando-se ao final Segunda Guerra, o quadro de transformações tecnológicas se acelera, ampliando a autonomia do que é produzido de quem a produziu, com uma nova ordem mundial, onde o controle informacional é a palavra de ordem: “ Atualmente, a informação não é só uma realidade autônoma, como lastimava Platão: ele é técnica e tecnológica. Os signos, como a República, mudaram de natureza, não apenas de circunstância” (PERRUCCINI: 2004, 40)

A autora esclarece que devemos ter cuidados para não confundir os conceitos mediação e mediatização, , embora tangenciais, pois isso acaba por prejudicar tanto o contexto sócio- cultural quanto a memória social.

Outra contribuição importante desse trabalho é o de clarear as diferentes acepções do termo dispositivo e novas abordagens acerca dele, sua natureza e propriedades. Depois de levantar algumas posições da literatura especializada sobre o tema, considerando-o como “instância capaz de dar existência social ao conhecimento” (pág 50) conclui:

Dispositivos de transmissão e comunicação, tais como as bibliotecas, que se utilizam de meios técnicos, linguagens e formas de interação intencionais, ao visarem à relação entre sujeitos e realidade, não são meros suportes de informação isentos. Ao contrário, sua configuração física, seus recursos, formas e práticas transformam seu discurso, sua estrutura e os modos de interação entre os sujeitos que lá atuam em ordem. Os dispositivos , enfim, não apenas expressam como também definem, por meio dos discursos implícitos em sua configuração, modos de relação entre os sujeitos e o universo simbólico (documentos, registros, informações, conhecimento) que guardam. (PERRUCCINI: 2004, 44)


Faz- se necessário, então, apropriar-se dos dispositivos, com suas lógicas e saberes próprios, e reformula-los, em conjunto com o desenvolvimento das competências informacionais. Essa postura deve gerar grandes mudanças, incluindo-se transformações em procedimentos já cristalizados dentro das estruturas de bibliotecas e da busca e apropriação de conhecimento. “A forma de tratamento do conhecimento transforma-se, também, em conteúdo” diz Perruccini na página 50, e dá prosseguimento declarando que a informação é a matéria- prima do conhecimento.

O estudo fala sobre o conceito de significação de Bruner, que se trata de dar sentido ao mundo, seus fenômenos, signos e informações. Esse processo usa ferramentas culturais próprias de cada tempo, espaço e individuo, além de faculdades intelectuais de processamento. A revolução tecnológica em curso acaba por interferir no processo de produção de significados, como nota Perruccini ao utilizar os conceitos de Bruner, pois constitui dispositivos que passam a “possuir identidade e linguagem próprias” e que promovem “a expansão das formas de construção de conhecimento, podendo fortalecer ou enfraquecer algumas dessas formas, a depender do contexto)” (página 54).

Outro aspecto hasteado, e não menos importante, que tangencia a questão do dispositivo, está a de que a descontextualização da informação e dos sujeitos agrava-se com a fragmentação do conhecimento. A descontextualização e a fragmentação só podem ser minimizadas com a apropriação dos dispositivos.

Assim, para enfrentar os problemas levantados para uma educação para informação é primordial o desenvolvimento de programas eficazes e não esporádicos, Essa propostas são diversas, como observa Perruccini, que foca seus estudos no campo da infoeducação “pois na nossa compreensão, a educação para a informação só ganha sentido efetivo se pensada em um quadro de redefinição da ordem informacional dos dispositivos. Daí que toda a ação educativa e cultural tenha que se encaminhar para a interrogação dessa ordem, uma vez que as práticas educacionais e culturais não são indiferentes ao modo como esta se apresenta.” (pág 57).

Obs:
Tinham "notas de rodapé", que, depois de desaparecerem no word, viraram "comentários", que também sumiram aqui no Blog, de qualquer forma eram explicação pequenas sobre alguns termos e autores que já trabalhamos anteriormente, em nada interfere (a não ser em algum rigor acadêmico) no texto acima


Nenhum comentário: