sexta-feira, 11 de abril de 2008

O Conhecimento Inútil RUSSELL, Bertrand_ resenha de Luciana rodrigues

O Conhecimento Inútil_resenha

Resenha do texto “O Conhecimento Inútil” da obra RUSSELL, Bertrand. O Elogio ao Óócio. 4. ed. Trad. Pedro Jorgensen Júnior. Rio de Janeiro: Sextante, 2002, por Luciana Rodrigues

No ano de 1950 o ensaísta, historiador, filósofo e matemático Bertrand Russell recebeu o Prêmio Nobel da Paz, como um grande opositor às guerras e defensor das liberdades. Durante a leitura dos quinze ensaios escritos para jornais da época, reunidos no livro ELOGIO AO ÓCIO, de 1935, é possível entender o porquê, apesar de se tratar de visão bastante dura do status quo, principalmente do capitalismo com ética calvinista, que propagandeia o trabalho como o fim, e não um meio, de toda a aventura humana.

Para Russel o trabalho não deve ser o objetivo de vida, o mundo deve dedicar algumas horas do seu dia ao ócio, para as atividades prazerosas, para a reflexão, ampliação dos conhecimentos e a contemplação. E a humanidade, defende, já tem mecanismos para permitir que isso aconteça.

Se nos anos de 1930 a análise de que o uso tecnológico deveria diminuir a jornada de trabalho (sugere 4 horas) e por fim ao desemprego, permitindo que todos tenham tempo livre já parecia lógica, hoje ela parece incontestável. Entretanto esse “tempo livre” não foi, ou é, o mote de nenhum sistema econômico que existe ou que já existiu, pois o ócio é permitido apenas para os donos dos meios de produção, obrigando aos trabalhadores a dedicarem quase todas as horas de suas vidas a atividades laborais que visam não seus prazeres, mas tão somente as suas subsistências e que retro alimentam sua exploração. O ócio total de uns é que não permite o lazer de outros:

A moderna técnica trouxe consigo a possibilidade de que o lazer, dentro de certos limites, deixe de ser uma prerrogativa de minorias privilegiadas e se torne um direito a ser distribuído de maneira equânime por toda a coletividade. A moral do trabalho é uma moral de escravos, e o mundo moderno não precisa de escravos (RUSSELL, 2002: 27).

Dentre os artigos mais empolgantes está O Conhecimento Inútil. Nele Bertrand Russell descreve sobre como o conhecimento é tratado hodiernamente, sendo considerado socialmente “útil” somente o que proporciona ao seu detentor o uso de poder ou vantagens econômicas. Para se contrapor a essa visão utilitária do conhecimento cita exemplos na história, como a Renascença, onde igualmente valorizados eram os prazeres de festejar, de pesquisar e da arte, em momentos, esclareça-se, em que o ócio não era visto como algo pernicioso. No mundo moderno a reflexão que leva a uma “atitude mental contemplativa” estaria descartada, bem como qualquer tipo de conhecimento que não seja “prático” do ponto de vista de uma ação, impedindo que as coisas se tornem mais agradáveis, por mais desagradáveis que possam ser, negando o prazer:


O mundo tem revelado uma exagerada tendência para a ação, não apenas uma ação sem prévia e adequada reflexão, mas também uma ação em momentos em que a sabedoria teria aconselhado a inação. Essa tendência se manifesta de muitas formas, algumas bem curiosas (RUSSELL, 2002: 44).

Algumas dessas “formas curiosas” seriam a do abandono, por parte das pessoas, de atitudes reflexivas em troca de atos de brutalidade, sem qualquer racionalidade, para obterem poder e admiração.

O homem, ao laborar de forma exacerbada, perdeu muito de sua capacidade criativa, já que o ócio é fundamental para a contemplação e desenvolvimento de saberes, como historicamente se provou, por exemplo, na literatura e na filosofia. Sim, dentre os conhecimentos considerados “inúteis” estaria a filosofia, já que essa não traz ações “práticos e úteis” como os mencionados acima. Russell manifesta sua oposição a isso, defendendo que a filosofia, como ação cotidiana, pode melhorar o mundo, propondo soluções aos problemas da humanidade, apesar de não definitivas nem exatas, eis que a busca constante pelo conhecimento, derivada das incertezas, é que engrandece as mentes.

As próprias universidades como espaços de saber, vêm se perdendo, dentro das posturas utilitárias de conhecimento e se afastando da sociedade, A exigência de um tipo específico de produção de modo sistemático nem sempre condiz com o seu papel, como bem mostrava Russel:

Hoje, espera-se que as universidades produzam de modo mais sistemático aquilo que a classe ociosa produzia apenas acidentalmente, como mero subproduto. Trata-se de um grande avanço, mas que tem seus inconvenientes. A vida universitária é tão diferente do mundo exterior que, no meio acadêmico, as pessoas tendem a ficar alheias às preocupações e problemas dos homens e mulheres comuns. Além disso, elas utilizam um jargão de tal forma especializado que em geral as opiniões que expressam deixam de exercer a influência que deveriam ter sobre o público em geral. Outra desvantagem é que os estudos universitários são estruturados de tal forma que alguém que conceba uma linha original de pesquisa freqüentemente se sente desencorajado. As instituições acadêmicas, por mais úteis que sejam, não são os guardiões adequados dos interesses da civilização num mundo em que todos os que vivem fora de seus limites estão ocupados demais para dar atenção a atividades não utilitárias (RUSSELL, 2002: 44)

A grande contribuição de Russell se soma a de outros livros e de outros autores que “ousaram” questionar dogmas da nossa sociedade. Não é o trabalho bruto que liberta a humanidade, mas a sua capacidade criativa de se sonhar diferente e de buscar soluções emancipatórias. Entretanto Russell, na sua defesa de um socialismo diferente do marxista, parece um pouco ingênuo já que não vai muito a fundo no que concerne ao fato de que a exploração ao trabalho é um dos alicerces da dominação capitalista e que não é o mero exercício da persuasão que vai mudar essa história.

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