sexta-feira, 4 de abril de 2008

os sete saberes de Morin. Resenha Luciana

Os Sete Saberes Necessários à Educação do Futuro_ resenha para a disciplina de INFOEDUCAÇÃO
Morin, Edgar - Os Sete Saberes Necessários à Educação do Futuro 3a. ed. - São Paulo - Cortez; Brasília, DF: UNESCO, 2001_resenha de Luciana Rodrigues

Edgar Morin é um dos grandes pensadores da atualidade, um espírito questionador, que já excursionou por diversas áreas, inclusive o cinema.
No seu livro Os Sete Saberes Necessários à Educação do Futuro, realizado a pedido da UNESCO, mais uma vez dá mostras do quão está atento às questões mais prementes da atualidade, propondo eixos para o ato de educar mulheres e homens para novos desafios contemporâneos, como sujeitos comprometidos na superação dos grandes problemas do nosso planeta e sociedade, vitimas de visões fragmentadas que acabam por torna-los “invisíveis” aos estudos e governantes.
São EIXOS, que fique bem claro. O livro, objeto dessa resenha, não se trata de um manual ou de uma proposta de novos currículos para as escolas é, antes, uma pauta transversal para o ato de educar, o que todas as educadoras e educadores devem ter sempre presentes ao lidarem com os jovens educandos, que não podem ser ignorados ou diminuídos de importância.

Os saberes seriam:

1- O Conhecimento
2- O Conhecimento Pertinente
3- A Identidade Humana
4- A Compreensão Humana
5- A Incerteza
6- A Condição Planetária
7- A Antropo-ética
De uma forma bastante fluida e ilustrativa Morin explica cada um desses “saberes”, e eu me permito resumi-los a seguir.

O Conhecimento
Os educadores, no geral, ao ensinarem suas disciplinas nas escolas e universidades, acreditam que estão transmitindo CONHECIMENTOS. Entretanto, destaca Morin, não se ensina O QUE É CONHECIMENTO. É fundamental situar historicamente o conhecimento, como algo que não é absoluto, dogmático, não é certo, nem é um espelho da realidade. O conhecimento é algo que deve ser questionado sempre, pois se trata de uma versão, de um recorte da realidade, uma tradução, passível de erros e ilusões por ser, como tal, fruto de reconstruções.
A reconstrução é algo pelo qual também passa a nossa percepção, que se opera através de estímulos mediados por transformações, decodificações e transportes a outros códigos, tal como é o fenômeno da visão, que Morin usa para exemplificar o que seriam as reconstruções sempre sujeitas a erros.
Então percepção e alucinação podem ser facilmente confundidas por qualquer um de nós. Estamos constantemente ameaçados pela ilusão, podemos acreditar na existência de algo que nada mais é do que uma confusão da nossa mente, dissipada apenas por saberes que já possuímos ou pela confrontação com outros. A própria história é pródiga em exemplos de erros podem gerar grandes desastres, como nas guerras, onde os opositores transmitem informações que escamoteiam o que lhes pode ser desvantajoso e ressaltam os pecados criminosos dos demais.
Resumindo: devemos deixar claro que não existem verdades únicas e absolutas, pois o que podemos considerar realidade é algo permeado e mediado, fruto de traduções e reconstruções que podem advir e gerar erros, que também podem ser causados por incompreensões decorrentes de várias diversidades culturais e de origem.
Daí entra o que seria uma consideração de normalidade. O fato é que tendemos a considerar nossos pensamentos e atitudes como sendo OS normais, portanto as mais fáceis de serem compreendidos e adotados, o que, salienta o autor, pode gerar uma postura normativa. O que não estaria dentro dos nossos padrões (normais) seria considerado um desvio. O autor o observa que essa atitude não é somente comum em seitas ou ideologias políticas, mas que também a ciência já se comportou dessa forma, ao negar determinadas idéias que depois foram aceitas, em paradigmas próprios de cada época , vale usar as suas palavras ao citar Lênin "as crenças e idéias não são somente produtos da mente, mas também seres mentais que têm vida e poder; e assim, podem possuir-nos".
O problema do conhecimento deve ser colocado em tela constantemente, a todos e todas, que devem ser encorajados na arte da tentativa e erro, na busca por uma realidade, que pode, e deve, ser confrontada a todo momento, como uma grande aventura a que devemos nos lançar, preparados para uma jornada rica em incertezas e surpresas.
O Conhecimento Pertinente

Morin constata que, comumente, ao se ensinar se transmite um conhecimento fragmentado, mutilando seu objeto. Não ensinamos as condições de um conhecimento pertinente.
Se a divisão do ensino em disciplinas especializadas, por um lado, ajudou no avanço do conhecimento por outra permitiu que o que existe de conexão entre elas se tornasse invisível, sem situar o conjunto da realidade, sem ligar as partes com o todo.
Nenhum saber altamente especializado consegue dar conta de um conhecimento pertinente do mundo, como mundo, sem se colocar dentro de um contexto maior. Esse entendimento é essencial, pois o contexto global exige de todos nós a organização das informações através do acesso a elas, para reconhecimento dos problemas que nos são comuns, entendendo que os contextos locais influenciam e afetam todo o contexto global, marcado por grandes problemas. O desenvolvimento da aptidão de organizar esse conhecimento deve ser um dos eixos da educação, ligando as partes e ao todo às partes, preparando para pensarmos e solucionarmos as crises planetárias.
O livro Os Sete Saberes necessários à educação do futuro detecta uma distorção entre as ciências e as humanidades nos sistemas de ensino, que portam antinomias e separam o que deveria estar unido, uma nova cegueira para os problemas globais . O resultado disso é um enfraquecimento das responsabilidades individuais e, assim, da solidariedade.
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A Identidade Humana

Assim como um dos eixos da educação deve ser o de contextualizar o conhecimento dentro da realidade do todo, não se pode ignorar o aspecto da identidade humana, constantemente fragmentada nas diversas disciplinas, como se ela não fosse, a um só tempo, física, biológica, psíquica, cultural, social e histórica. O ensino fragmentado acaba por tratar o indivíduo de forma fragmentada também, como se fosse possível dissociar o indivíduo como parte de uma espécie E de uma sociedade, da qual depende e pela qual é responsável.
Essa relação se dá, assim, em forma de tríade: indivíduo/sociedade/espécie e é assim que deve ser tratada na transmissão de TODOS os saberes educacionais. Todos os indivíduos são seres diversos e unos, fragmentos e todo, um não deve anular o outro, e assim devem ser tratados em todas as esferas do conhecimento.

A Compreensão Humana

A palavra compreender vem do latim compreendere, que quer dizer: colocar junto todos os elementos de explicação. A compreensão abarcaria um significado racional, objetivo e um significado subjetivo, humano. O primeiro busca significado lógico, intelectual, se baseia em explicações formais, mas que estão sujeitas a ruídos e erros diversos. O segundo vai além de qualquer entendimento lógico, de análises objetivas, por ter em si cargas emotivas que são comuns aos da nossa espécie, atraídos por empatia, identificação, projeção e que geram solidariedade.
Afundados em sua cegueira, os sistemas educacionais não se preocupam em ensinar a compreender, não demonstram que somos parte de um planeta e que o futuro dele, e do nosso, por conseguinte, nos tornam dependentes um dos outros. Não somos estimulados a compreender o próximo, esteja ele realmente próximo, como nosso vizinho, ou no outro lado do planeta. Então o que acabamos por valorizar é um individualismo nefasto, que nos faz rejeitar ou ser indiferente ao outro, destruindo qualquer capacidade de compreensão e comunicação.
A compreensão deve ser estudada em sua gênese e nas suas conseqüências, como os preconceitos de qualquer forma, sexuais, de gênero, raciais e étnicos, para que as relações de solidariedade sejam maiores dos que as diferenças geradas pela incompreensão.

A Incerteza

Um dos grandes inimigos do ato de educar deveriam ser os dogmas. As escolas devem ensinar que a inexistência de verdades absolutas levam às incertezas e que elas são, isso sim, a regra, (e não a certezas). Ao transmitirem somente conhecimentos que as ciências têm como certos se acaba por ignorar incertezas históricas que foram fundamentais, inclusive nas ciências biológicas, físicas e humanas. Assim se deu, até mesmo, na evolução das espécies, sujeitas a diversas ramificações.
Quando salientamos a existência de incertezas devemos ensinar como enfrenta-las, tendo como horizonte o inesperado. Morin cita o o poeta da ironia trágica Eurípedes (aproximadamente no ano 496 a 405 da era pré-cristã, em Ática): “O esperado não se cumpre, e ao inesperado um deus abre o caminho".
Qualquer visão determinista que procurava dar um sentido único para a história da humanidade caiu por terra frente a uma quantidade de acontecimentos graves, e totalmente inesperados, como as grandes guerras.
Ensinar para as incertezas não deve servir para desencorajar ou estimular posições hedonistas ou voluntaristas, antes deve contribuir com o entendimento de que esse futuro é aberto, incerto, mas que pode ser construído levando-se em conta os erros e as incertezas que surgem e que são passíveis de correções.

A Condição Planetária

Que somos parte do mesmo planeta e temos responsabilidades entre nós, seres humanos e ele, o planeta, já falei nessa resenha. Mas vale comentar mais uma vez que esse estudo para a UNESCO preocupa-se particularmente com a questão de que estamos todos interligados, principalmente em tempos de globalização. Tudo se conecta, tudo se liga, tudo está interdependente, todavia os bancos educacionais, soterrados por informações desorganizadas e excessivas, não conscientizam de que os problemas do planeta se agravam e afetam a todos os seres humanos, em um destino comum.
Vivemos tempos de grandes ameaças de nível global, a degradação do planeta por desastres ecológicos ou nucleares.
Então só apontar para os problemas da humanidade é muito pouco, dada as suas complexidades, embora todos estejam ligados. O ensino deve mostrar que esses problemas não estão externos aos jovens, mas que são parte de sua humanidade, e comunidade e seu destino comum, criando uma consciência planetária que deve incluir a ecologia, a luta pela qualidade de vida, a resistência à vivência puramente utilitária, valorizando os prazeres, o combate ao consumo padronizado, a emancipação em relação à tirania do lucro e o fim de qualquer forma de violência.

A Antropo-ética
O processo educacional deve ser orientado pelo que o pensador francês chama de antropo- ética.
A ética, como já foi dita diversas vezes e por diferentes estudos, depende da cultura espacial e temporal na qual está inserida. Também a moral e a ética dependem da natureza humana. Então temos presente aspectos individuais, sociais e de espécie presentes na condição humana, que fazem o indivíduo desenvolver conjuntamente sua autonomia pessoal, sua participação social e a ética já que, como foi dito, temos todos um destino comum. Somente a democracia pode desenvolver a faceta social da antropo- ética, pois é a única que permite que a relação indivíduo- sociedade se desenvolva de forma quase plena (a democracia, principalmente a representativa, possui limitações), porque a democracia é um exercício de controle, fundamental para o desenvolvimento da responsabilidade planetária.
Educar com base na antropo- ética é conscientizar sobre a cidadania, que não se limita a um espaço pequeno, comunitário, mas é planetária. Ser cidadão terreno é ser responsável pelo combate aos grandes problemas da atualidade.
Essa integração da humanidade deve passar por uma mudança de pensamento a favor da integração educacional (sem destruição das disciplinas ou programas), e pela construção de ciências que reúnam essas concepções de indivíduos planetários, em uma “concepção sistêmica da terra”, que supere a concepção fragmentada do mundo e distorcida da realidade e que permita, de fato, “civilizar a terra”.

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